Uma idosa completando 89 anos. O que esperar da comemoração? Um monte de parentes que não queria estar na festa de aniversário realmente, julgando uns aos outros, acompanhados por suas hipocrisias e seus filhos elétricos, esse é o contexto do conto e você provavelmente sabe bem como é isso.

Zilda, a filha que cuida da mãe idosa, sente repulsa daqueles que abandonaram a velha para ela cuidar, afinal, sempre sobra para alguém. Todos estão fingindo, conversando e sorrindo e fingindo. Acho que eu já vi essa cena antes, e você?

Anita, a velha aniversariante, fica parada e quieta, observando tudo. Todos aqueles anos, toda a sua vida. Ela foi uma mulher que cumpriu seu papel na sociedade de sua época: casou no momento certo, serviu ao marido, cuidou dos filhos e da casa. E o que ela via agora? Um bando de noras fracas e vaidosas que não sabiam criar os filhos, obedecer aos maridos e que nunca seriam capazes de aguentar metade do que ela aguentou. Sob sua perspectiva cultural ultrapassada, ela surta e cospe no chão, pedindo vinho e xingando a todos de cornos e vagabundas.

A autora retrata tudo o que nós já vivenciamos em situações como essa: todos se espantam, mas ninguém diz nada a respeito, só reprovam Zilda, que não sabe educar a mãe velha. São todos mentirosos e atores aguardando ansiosamente pelo fim da encenação antes que alguém jogue o primeiro tomate.

E quando a festa termina, o que acontece? "- Até ano que vem, mamãe!", ou seja, os filhos só visitavam a mãe deles em seus aniversários, uma vez ao ano, por obrigação. Aniversários supostamente celebram a vida de alguém, mas nesse cenário se sente a espera constante pelo fim da vida de dona Anita.

Clarice nos dá um tapa na cara, porque isso acontece em todas as famílias, um cuida e os outros visitam uma vez ao ano para dizer que ainda se importam. Enquanto lê, posso garantir que você sentirá a hipocrisia do início ao fim, e vai doer, vai acontecer um dejavu. Você já viu isso antes, mas esse conto vai te mostrar o quão horrível e inevitável é esse fim que todos teremos quando estivermos próximos da morte. Não vai ser legal, entretanto estaremos velhos demais para fazer algo a respeito.