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Você, Escritor! - Como caracterizar e evoluir personagens

quarta-feira, março 27, 2019


Como todos sabem o que move um livro/filme/série é a caracterização do personagem, sua história de vida, sua personalidade e o seus valores. Através desses pontos ele se move e demonstra quem é e o que representa no enredo elaborado. Pois, vamos concordar, por mais que o livro seja maravilhoso com uma trama bem elaborada, se o personagem em questão for um completo inútil, sem sal e todo o mais, muito dificilmente alguém dará continuidade a experiência de conhecê-lo, pois simplesmente não haverá o que conhecer por ele não estar acrescentando nada ao enredo e muito menos criando simpatia do leitor, entende?

Pois então, nessa hora deveríamos nos perguntar o valor de nossos personagens.

Um dos valores que eu mais gosto de utilizar é a questão da família e a amizade, pode ser meio clichê, mas são dois fatores que eu tenho tendência a usar em algum personagem em algum livro que eu crio. Claro que há características que podem ser postas no lugar desses dois nichos, podemos, por exemplo, dizer que o que mais importa para A é a justiça, a igualdade ou até mesmo as diferentes formas de amor. 

Então para exemplificar, irei retratar dois personagens de séries conhecidas e como seus valores vão mudando conforme os episódios/temporadas passam. O que importa eles pode não mudar até o final, mas percebam que com o tempo eles mudam, criam mais camadas sobre eles mesmos. E isso deve estar presente em nossos personagens, pois eles são pessoas e pessoas não são simples, todas tem camadas, pensamentos diferentes que mudam e isso é importante para o desenvolvimento.

Mas enfim, vamos falar sobre os personagens?


Walter White (Breaking Bad): Um dos personagens mais icônicos da televisão americana, eu o considero um dos personagens mais complexos que já vi. Apesar de eu mesma não ver muitas séries, esse em questão conseguiu me deixar apreensiva, surpresa e interessada em descobrir mais sobre sua vida e quando tudo acabou só pude pensar: meu deus do céu, como assim? Então nada melhor do que falarmos de Walter White, vulgo, Heisenberg, sobre seus valores e caracterização, não?

Para começar, Walter é um humilde professor de química, é pai de família e em seu aniversário de 50 anos descobriu ter câncer de pulmão. E ele, como todo homem de família não deseja que eles arquem com as dívidas do hospital, e quer fazer de tudo para que tenham dinheiro suficiente para se cuidarem quando ele partir. Tendo isso em mente ele tenta descobrir o que fazer, ele deseja ajudá-los e a aí que percebemos o que importa para ele: a família.

E para ajudar a família eis a brilhante ideia de Walter: produzir Metanfetamina e vendê-la, e então o dinheiro juntado seria deixado para que eles não precisassem se preocupar com as despesas futuras sobre o ensino de seus filhos. Porém, conforme o tempo passa e ele se envolve cada vez mais com o mundo das drogas percebemos um novo interesse sendo desenvolvimento pelo Walter, ele não deseja apenas fabricar para ajudar sua família e parar depois de terminar o seu tratamento do câncer ou morrer devido ao seu estágio avançado. Ele passou a querer ter o poder e o controle da situação.

Ele desenvolveu a necessidade de estar no topo, de querer manter o controle de sua produção, de sua rede de distribuição. E ninguém, ele deixava bem claro isso, o impediria de alcançar o que queria. E por causa desses novos valores atribuídos pela necessidade de saber de que havia algo no qual era bom, fugindo completamente da visão de que todos supostamente tinham dele de um professor medíocre de química que sequer teria o suficiente para pagar as despesas médicas ou condições de deixar dinheiro para a família quando morresse.

Estão entendendo aonde quero chegar? Walter é um personagem que iniciou de um jeito e terminou de outro completamente diferente. Ele se revela como um dos maiores traficantes e produtores de metanfetamina, assim como mostra-se ter uma inteligência superior à polícia. Ele engana a todos, cria falsas histórias completamente acreditáveis. Não se vê como o vilão, justamente por estar agindo em prol de sua família que é o seu fator primário.

Mas uma vez que tudo acaba, quando não há motivos para continuar o que estava fazendo, por que ele continua com a produção? Por que Walter continua fazendo quando não há mais um por quê no meio da série? A resposta é simples, tal como eu disse mais cedo ele passou a se importar com o poder e o controle e por causa disso todos seus valores entraram em conflito.

Ele deseja estar no topo. Ele gosta do que ele faz. E ele acredita ser muito bom nisso. Mas isso entra em conflito com o seu valor principal que é justamente aqueles que ele queria proteger, salvar, fazer de tudo para lhes dar uma boa vida. As suas decisões e a transformações do que realmente lhe importavam definiu quem e o que ele era realmente.

Ele não era Walter White, professor de química. Ele era Heisenberg, produtor e distribuidor do cristal mais puro jamais visto.


Bojack (Bojack Horseman): Um personagem de um seriado animado que vem ganhando espaço com esse personagem um tanto problemático. Eu particularmente amo a complexidade que ele apresenta e como ele reflete sobre suas escolhas, mesmo sabendo ser erradas acaba as fazendo puramente por não saber o que fazer. Ele mostra como as pessoas são imperfeitas, como muitas podem ser ruins só por serem. Seus sentimentos de arrependimento, de medo, o terror que sente em interagir com alguém quando nem ele mesmo sabe como o fazer... É um personagem com várias camadas a serem refletidas, mas podemos ter certeza de uma coisa. O que mais importa para esse personagem é a fama, não por ser viciado em dinheiro e sim por ter sido a única coisa em sua vida que deu certo e aparentemente ser algo que ele possa se agarrar firmemente mesmo que considere quase todas suas escolhas errôneas.

Bojack é um homem cavalo que tem mais de 50 anos, nascido em uma família desestruturada que acabou encontrando refúgio assistindo Secretariat, um cavalo de corrida que ganhou inúmeras vezes. A partir dali ele quis se tornar ator, fugir da realidade agonizante de ter tido pais que não cuidavam dele, pais negligentes. Ele queria mostrar que podia ser o orgulho deles, então se tornou protagonista de Horsin' Around, um sitcon famoso nos anos 90 que o levou ao topo, sendo conhecido e amado por todos. A partir dali Bojack passa a se importar com a sua fama, a ser reconhecido. Ele gosta que as pessoas saibam quem ele é, o que ele fez e onde ele está. Mas ele não gosta de se expor as pessoas, sobre o seu lado pessoal, acredita ser tudo uma grande besteira e as coisas começam a mudar quando na primeira temporada é proposto a ele escrever uma biografia para que pudesse salvar sua carreira que afundava.

A partir daí percebemos as reflexões que ele cria. As mudanças que sua vida passa a ter, o medo de se expor em uma biografia onde todos perceberiam que ele é uma pessoa horrível. Onde saberiam que cresceu em um ambiente nem um pouco agradável. O medo dele não ser visto como alguém perfeito o atormentava, mas mesmo assim teve que enfrentar a realidade: ele não era perfeito. Assim como qualquer outra pessoa ele tinha defeitos e não precisa se sentir mal em demonstrá-los em uma biografia sobre si. Esse foi o começo de Bojack saindo de sua bolha, observando as pessoas ao seu redor e a interagir.

Como eu disse logo no começo o que mais importa para o Bojack é a fama e isso não muda em nenhuma das temporadas, ele valoriza ser conhecido. Ele valoriza ser uma estrela do cinema e quer voltar a cresce como antigamente. Mas, novamente, ele tem medo de tudo. Ele tem medo de enfrentar o seu passado, faz escolhas erradas por não pensar em outras opções que fossem menos precipitadas. Mesmo quando ele criou o valor da amizade nele, sequer consegue demonstrar como isso o importa.

Bojack é o perfeito exemplo de um personagem desestruturado que tem seus altos e baixos. Ele quer melhorar. Ele deseja melhorar. Ele não quer ser o mesmo que era há vários anos, mas ao mesmo tempo quer que muitas coisas não mudem. Ele tem medo da mudança, ele tem medo de lutar contra os demônios que vivem dentro dele (as drogas, as bebidas, o sexo e etc). Bojack é alguém que luta diariamente apenas para continuar respirando o mesmo ar que muitos.

Ele é imperfeito até demais. Mas esse é um dos charmes desse personagem e como ele consegue fisgar a atenção de alguém é impressionante, pois ele se mostra vulnerável conforme os episódios passam. O seu desenvolvimento para com outros personagens também é incrível, muito bem feito e por mais que a série ainda não esteja finalizada, tem muito pano a ser percorrido ainda e acredito que assim como Walter White ele seja um dos melhores já criados.

Então, eu deixo as seguintes perguntas a vocês:


  • O que mais importa ao seu personagem?
  • Como que os valores podem interferir em suas decisões?

É isso por hoje, obrigada por terem lido meu post. Sei que escrevo demais, mas espero que isso ajude vocês a terem uma luz em sua jornada como escritores.

Beijos e até a próxima!

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